PHENOMENOLOGICAL STUDIES - Revista da Abordagem Gestáltica

EDITORIAL

Celana Cardoso Andrade — 2023-12-30

É com entusiasmo que apresentamos o segundo número de 2023, onde temos discussões
em torno de vários temas relacionados a reflexões em torno dos campos humanistas,
fenomenológicos e existenciais em suas interfaces os com a ansiedade; saúde mental de
professores universitários; dependência química; religiosidade e sentido de vida; diversidade,
equidade e inclusão de pessoa LGBTQIA+; plantão psicológico; morte; luto; corpo e formação.
Ao todo temos seis pesquisas empíricas e quatro estudos teóricos com bases da Fenomenologia,
Gestalt-terapia, Logoterapia e Abordagem Centrada na Pessoa.
Diego Michel Godoy e Denise Borella de Sousa Costa apresentam a primeira pesquisa
empírica do volume acerca da ansiedade, situação que atinge, segundo a OMS, 9,6% da
população atual, intitulada Contato, relações e temporalidade: a compreensão da ansiedade
sob a perspectiva fenomenológica cujo objetivo foi compreender a experiência da ansiedade
disfuncional através da percepção do acometido, buscando entender a significação atribuída aos
sintomas, as relações e a temporalidade.
Em seguida, Shirley Macêdo; José Luís Amorim e Julio Cesar Nascimento Sol Posto
Oliveira apresentam uma pesquisa cujos reflexos ainda estão presentes...

CONTATO, RELAÇÕES E TEMPORALIDADE: A COMPREENSÃO DA ANSIEDADE SOB A PERSPECTIVA FENOMENOLÓGICA

Diego Michel Godoy — 2023-12-30

A ansiedade é uma força mobilizadora inerente ao ser humano, tensão que estimula reorganizações necessárias para o desenvolvimento e sobrevivência, mas que se intensifica caso não haja suporte para as mudanças almejadas, chegando a níveis qualificados como patológicos. Durante estudo realizado pela OMS foi constatado que 9,6% da população estava acometida de alguma síndrome ansiosa. A pesquisa objetivou compreender a experiência da ansiedade disfuncional através da percepção do acometido, buscando entender a significação atribuída aos sintomas, as relações e a temporalidade. Optou-se por uma pesquisa fenomenológica, realizada com três participantes do gênero feminino, com idade entre 25 e 35 anos, em acompanhamento psicoterapêutico, com demanda que caracterizava quadro de síndrome ansiosa e que não estavam utilizando medicação psiquiátrica. Os dados foram coletados através de entrevista semiaberta com a pergunta disparadora: “como você se sente afetada pela vivência da ansiedade?” Posteriormente analisados através do método fenomenológico de Giorgi. Concluiu-se que as acometidas atribuíram a si um conceito diminuto, gerando autocobrança e punição; os sintomas são significados como características da personalidade, e as relações interpessoais podem facilitar tanto a autopercepção, sendo um suporte para o desenvolvimento, quanto a alienação, influenciando o adoecimento. As acometidas também apresentam dificuldade em lidar com a temporalidade, principalmente com o aspecto futuro.

O ENSINO REMOTO EMERGENCIAL PARA DOCENTES DE UNIVERSIDADES PÚBLICAS NORDESTINAS

Shirley Macêdo — 2023-12-30

Esta pesquisa objetivou compreender experiências no ensino remoto emergencial e condições de saúde mental entre docentes de universidades públicas nordestinas acometidos ou não pela covid-19. Utilizou-se o método fenomenológico de tendência empírica e entrevistaram-se, individualmente pela plataforma Google Meet, oito docentes de cursos de graduação presenciais que ministraram disciplinas remotamente durante a pandemia da covid-19. Identificaram-se, dentre outros resultados: falta de habilidades tecnológicas, insegurança, desmotivação, insatisfações diversas, sobrecarga de trabalho remoto, desregulações físicas, alteração da rotina doméstica e necessidade de capacitação em tecnologia digital de informação e comunicação. Diante da crise econômica pela qual passam as universidades públicas brasileiras e pelo provável advento do ensino híbrido, conclui-se a urgência de políticas públicas de atenção psicossocial aos docentes para dirimir impactos nocivos à sua saúde mental.

RELACIONAMENTOS AMOROSOS DE INDIVÍDUOS ADICTOS EM RECUPERAÇÃO: UM OLHAR GESTÁLTICO

Dionatans Godoy Quinhones — 2023-12-30

A dependência química é uma problemática que se instalou nas relações humanas, sendo considerada pela Organização Mundial da Saúde como um dos problemas de saúde mais graves do último século. Há carência de estudos que abordem a adicção a partir da ótica do indivíduo adicto. O objetivo deste estudo foi investigar, por meio da Gestalt-terapia, quais as percepções e sentidos produzidos por indivíduos adictos sobre o relacionamento amoroso no âmbito da sua recuperação. O método fenomenológico, qualitativo e exploratório foi utilizado, e os participantes responderam a um questionário semiestruturado contendo 12 questões, cinco fechadas e oito abertas. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Os resultados apontam sujeitos com maior tempo de abstinência, casados ou solteiros, que demonstraram a importância do relacionamento amoroso, referindo-se como algo bom para seu desenvolvimento e sua recuperação, tendo clareza dos limites de sua fronteira de contato. Para aqueles sujeitos cujos limites são claros, o relacionamento amoroso tem sentido positivo e satisfatório em suas vidas. Entretanto, para aqueles cuja formação de figura e de fundo é ofuscada, conforme identificado nos sujeitos com perfil de pouco tempo de abstinência, o relacionamento amoroso traz um sentido negativo, de substituição da droga.

RELIGIOSIDADE E SENTIDO DE VIDA: APROXIMAÇÕES ENTRE PRÁTICA RELIGIOSA E VALORES DE SENTIDO

Kauany Dionísio — 2023-12-30

Na contemporaneidade o adoecimento psicológico aumenta constantemente. Segundo a Logoterapia, uma das causas de sofrimento do homem moderno é a falta de sentido, traduzida em frustração existencial. Um fator que se relaciona positivamente com os níveis de sentido de vida e se apresenta de modo específico na contemporaneidade é a religião. O objetivo dessa pesquisa foi verificar como a prática religiosa estimula a vivência dos valores de sentido propostos por Viktor Frankl para o encontro do sentido de vida, em cristãos. Tratou-se de uma pesquisa de campo qualitativa do tipo descritivo-exploratória, com uma amostra de 8 participantes adultos, de confissão católica ou protestante, usando como critério de seleção a técnica de snowball e a saturação dos discursos. Estes foram analisados com base na Análise de Conteúdo de Bardin, formando-se três categorias, divididas em duas subcategorias para cada, onde verificou-se que a religião atua como um fator estimulante da vivência dos valores, através de atitudes experienciais relacionadas, especialmente, ao trabalho social e caritativo, aos vínculos amorosos com o círculo familiar, à empatia social, ao Divino, e às atitudes diante do sofrimento vivido por luto, separações conjugais, e conflitos sociais.

EXPERIÊNCIAS DE PESSOAS LGBTQIA+ EM AMBIENTE ORGANIZACIONAL: CONTRIBUIÇÕES DE UMA ANÁLISE HUMANISTA À GESTÃO DA DIVERSIDADE, EQUIDADE E INCLUSÃO

Wander Luiz Reginaldo — 2023-12-30

Este artigo apresenta resultados de uma pesquisa qualitativa de natureza exploratória a partir da abordagem “centrada na pessoa”, típica do humanismo de Carl Rogers. Tem por objetivo compreender a experiência de pessoas LGBTQIA+ no ambiente organizacional. Foram realizadas entrevistas não estruturadas, seguidas por uma pergunta disparadora. Após os encontros, as entrevistas foram transcritas e analisadas a fim de que o sentido implicado no fenômeno observado pudesse ser compreendido. A percepção do pesquisador sobre a essência manifesta foi dividida para melhor compreensão da experiência nos seguintes elementos: (1) os participantes LGBTQIA+ narraram que o ambiente organizacional atuou como inibidor de suas potencialidades e modo de ser; (2) os participantes relataram expressar sintomatologicamente as consequências de estarem numa organização que desvalorizasse suas vivências enquanto LGBTQIA+; (3) a percepção de pessoas LGBTQIA+ sobre interseccionalidade e equidade no trabalho; (4) a diversidade como fator positivo para o desenvolvimento das organizações e de crescimento para pessoas LGBTQIA+. Além disso, em congruência com a metodologia proposta, foi realizada uma aproximação entre os conceitos organizacionais e a psicologia humanista, podendo ser possível reconhecer o ambiente organizacional, em geral, como supressor das potencialidades de pessoas LGBTQIA+.

A AUTENTICIDADE COMO EXPERIÊNCIA DO TERAPEUTA INICIANTE NO PLANTÃO PSICOLÓGICO

Mariana Dutra dos Santos — 2023-12-30

Este trabalho objetivou analisar como se dá a experiência da autenticidade por parte do terapeuta plantonista iniciante. Para tanto, debruçou-se sobre atendimentos realizados por terapeutas iniciantes no plantão psicológico da clínica-escola de Psicologia de uma universidade pública do Brasil. Trata-se de uma pesquisa qualitativa descritiva que avança na literatura sobre congruência na perspectiva da abordagem centrada na pessoa. O contexto de coleta foi o serviço de Plantão Psicológico da referida universidade durante seu funcionamento on-line. Participaram do estudo 5 plantonistas orientados pela Abordagem Centrada na Pessoa. Foram coletadas e analisadas 63 versões de sentido elaboradas pelos participantes durante um semestre de atendimentos. O método de análise de dados foi o Fenomenológico Empírico. Os resultados demonstraram que a autenticidade enquanto experiência do terapeuta pode ser expressa de 3 formas: em contato com o cliente, em contato consigo, pedindo detalhes/expressando dúvida. Como principal contribuição, constatou-se que, mesmo em uma modalidade breve de atendimento a autenticidade pode manifestar-se enquanto experiência do terapeuta, facilitando o processo do cliente.

"ALGUNS VÃO MORRER, LAMENTO, É A VIDA”: COMPREENSÕES ENTRE NECROPOLÍTICA E GESTALT-TERAPIA

Eloísa Amorim de Barros — 2023-12-30

Este ensaio apresenta interlocuções entre Necropolítica e a Gestalt-Terapia, em um contexto de pandemia da Covid-19 no Brasil. Desde o início da pandemia, o país vivencia um quadro sanitário crítico e oscilante, que até o presente já acumula a marca de milhares de vidas perdidas, com estratégias de controle, prevenção e cuidado pouco eficazes, inicialmente. A compreensão dos impactos da pandemia, depende de uma observação atenta do cenário político brasileiro, em especial, às medidas de enfrentamento nas esferas federal, estadual e municipal. Entendendo a necropolítica como a “expressão máxima da soberania” e considerando, Gestalticamente, que não há a possibilidade de pensar a pandemia e tudo o que dela decorre, fora do contexto em que se apresenta, este texto considerará a vulnerabilidade enquanto fenômeno de campo e os sofrimentos advindos das relações construídas neste a partir da clínica da violação e do sofrimento ético-político e Antropológico.

FENOMENOLOGIA E LUTO: POSSÍVEIS CONTRIBUIÇÕES SOB O VIÉS HEIDEGGERIANO

Iuri Pimentel — 2023-12-30

O artigo visa abordar o fenômeno do luto sob um viés fenomenológico-hermenêutico heideggeriano, contemplando para isso alguns dos principais existenciais desenvolvidos pelo filósofo alemão, tais como, o modo de ser na impessoalidade, finitude, cuidado, angústia e ser-para-a-morte. O trabalho visa a compreensão do luto enquanto fenômeno possível de ser experienciado por todo ser-aí [Dasein], uma vez que, sendo ontologicamente ser-para-a-morte, a possibilidade do outro faltar também está desde sempre lançada em nosso horizonte histórico de sentido. O artigo contemplará uma breve introdução acerca da morte em nossos dias, em seguida abordando reflexões sobre o fenômeno do luto inspirados na analítica existencial proposta por Heidegger. É importante ressaltar que o filósofo não se debruçou acerca da temática, todavia, propiciou material suficiente para tal empreitada. Por fim, espera-se anunciar novas possibilidades de compreensão acerca desse caro fenômeno humano.

O TRABALHO CORPORAL EM GESTALT-TERAPIA

Roberta Cezar — 2023-12-30

O corpo é o lugar onde as relações, os afetos e os processos intra e intersubjetivos acontecem. Para a Gestalt-terapia é por onde a vida passa, considerando cada indivíduo um corpo preenchido por histórias, marcas e memórias. Porém, ainda assim, o corpo tem sido posto majoritariamente enquanto objeto ou máquina, embebido por um sistema capitalista, no modelo neoliberal. Igualmente importantes são as biografias que constroem contornos existenciais singulares, inscrevendo narrativas de horror ou prazer em cada corpo-pessoa. Com isso, no contexto psicoterapêutico, pode-se encontrar um grau elevado de distanciamento entre os indivíduos e as próprias experiências corporais, com produção de sintomas e interrupções no contato consigo, com os outros e com o mundo. Nesse sentido, a clínica gestáltica precisa estar atenta, sensível e aberta aos diversos modos de estar e sentir corpo, compreendendo que não é possível uma Gestalt-Terapia dissociada dos processos corporais. Portanto, o presente artigo propõe uma discussão acerca do trabalho corporal em Gestalt-Terapia, sobretudo a partir das perspectivas de James Kepner e de Mirta Domato.

A RELAÇÃO DIALÓGICA NAS FORMAÇÕES EM GESTALT-TERAPIA: REFLEXÕES GESTALTPEDAGÓGICAS

Gustavo de Assis — 2023-12-30

Este estudo parte da Gestaltpedagogia, que compreende a educação em uma perspectiva integral, para contemplar, nos processos formativos, a totalidade do ser humano, com ênfase no aspecto relacional. Sendo assim, este ensaio teórico objetiva compreender a relação dialógica entre o estudante e o professor nas formações em Gestalt-terapia. Nesse sentido, a relação dialógica foi considerada como um instrumento basilar na formação do vir-a-ser do Gestalt-terapeuta. Concebe-se a Gestaltpedagogia como uma pedagogia buberiana ou como uma Gestaltpedagogia do encontro, em que a formação do Gestalt-terapeuta é constituída na e pela relação, com ênfase no aspecto vivencial, em busca da emancipação do aluno em seu percurso formativo. No campo da Abordagem Gestáltica, entendendo o Gestalt-terapeuta como um profissional da relação, a ênfase dialógica mostra-se como um instrumento significativo para a aprendizagem clínica. Assim sendo, o campo da Gestaltpedagogia revela-se como uma Gestalt aberta para novas investigações na área da educação de psicoterapeutas no contexto brasileiro.